domingo, 17 de maio de 2009

Sobre o filme "Árido Movie"

Exibição do Cineclube AZouganda na IX Semana de História da FFPNM - 13 de maio de 2009.

Árido Movie: Sertão e Lisergia

Amin Stepple Hiluey


Edição: Amanda Ramos


Crepúsculo em Salvador, final dos anos 70, o cineasta Glauber Rocha, com os sete buracos da cabeça a mil por hora, pergunta ao também cineasta Jomard Muniz de Britto: “os intelectuais da Fundação Joaquim Nabuco ainda estão no Cuba Libre?”

Árido é uma road-expedição, sociológica e antropológica, ao Brasil profundo. Maconha, crime, vendeta familiar, banditismo rural. Prostituição, clientelismo político, misticismo secular. Escassez de água, disputa de terra, choque cultural, sermões desconexos. Ronco de motos, idiotia rural, rodovias duplicadas, paisagem esturricada. Índios aculturados, machismo estereotipado, matriarcado virago. E a oralidade surreal da última Flor do Lácio: o dialeto arcaico sertanejo redivivo, saldo colonial, em diapasão dissonante com o maconhês metropolitano, herança lingüística da contracultura. Está tudo lá nos grotões de Árido Movie.

Como, aliás, sempre esteve. Parafraseando Nelson Rodrigues, o sertão não se improvisa, é obra de séculos. Mas Árido é uma obra de aggionarmento do Cinema Novo dos anos 60. Ou até mesmo do cinema brasileiro dos 90, do próprio Baile Perfumado, com sua seca verde e o uísque importado de Lampião. Ou, ainda, se quiserem, da melhor tradição da literatura regional (dos 20 aos 40). Ao mesmo tempo, reforça a tese de que o cinema brasileiro está condenado a filmar e refilmar o “sol de dois canos” do sertão. Pena mais branda do que a do cinema americano, condenado a ficcionar as guerras em que o Império se mete a cada década.

Nas várias fases do cinema brasileiro, o sertão sempre foi uma location revisitada. A emprestar a sua geografia física e humana para que, através do cinema, o País se conheça e se reconheça em sua própria História, com suas questões sociais e econômicas praticamente inatacadas, imunes à evolução dos tempos, apesar das sucessivas retóricas oficiais de transformação e redenção.

Vez por outra, num criativo fatalismo cíclico, surge um novo olhar sobre a velha paisagem e suas almas secas. É o caso de Árido Movie, com sua originalidade lisérgica a se contrapor ao acumulativo histórico realista, teatralizado. Mais liberto e distanciado do realismo, este filme desbrava o sertão deste início de século com os olhos livres, e é também dessa maneira que o filme pede para ser visto. Malgrado a percepção do ineditismo das factualidades ser absolutamente ilusória, embaralhada pelo “barato” da miragem lisérgica.

A rigor, Árido é um filme muito além da nossa época. Longe de atrasar, “os ponteiros infectados de tempo” (poeta Ângelo Monteiro), e não são poucos, adiantam em alguns anos o relógio de Árido Movie, dando a necessária continuidade ao continuado nos sertões imemoriais do cinema brasileiro.

Assim, Árido Movie reescreve a profecia alada do Conselheiro: o sertão vai virar Io. Enquanto colabora para editar a novíssima história do cinema brasileiro. A exemplo de Amarelo Manga, de Cláudio de Assis, e de Cinema, Aspirinas e Urubus, de Marcelo Gomes. Com Árido, o cinema pernambucano comprova mais uma vez: é amarelo mas tem saúde.

Em tempo: os intelectuais do Joaquim Nabuco continuam no Cuba Libre?

Quanto ao cineasta Jomard Muniz de Britto, a única experiência dele com droga se limitou a um comprimido de aspirina com leite quente e canela, receita do médico João Guimarães Rosa para a cura da gripe.

Leia este artigo completo: http://www.geneton.com.br/archives/000167.html


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