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segunda-feira, 13 de julho de 2009

Tarantino e a pressão de Hollywood

Divulgação Tarantino, que mudou "Bastardos Inglórios" após Cannes

Por Leonardo Cruz

Mike Fleming, blogueiro da “Variety”, publicou nesta quinta uma boa entrevista com Quentin Tarantino sobre a versão final de “Bastardos Inglórios”, o novo longa do diretor de “À Prova de Morte”, “Kill Bill” e “Pulp Fiction”. Como é uma entrevista da “Variety”, a discussão gira em torno mais da pressão do lançamento comercial e da expectativa de retorno financeiro por parte dos estúdios (Weinstein e Universal). E as respostas do cineasta são um interessante exemplo de como as coisas funcionam em Hollywood.

A seguir, os trechos mais interessantes da conversa, na tradução mambembe deste blogueiro. Para ler o original, em inglês, clique aqui. Para quem é fã de Tarantino, o fim de 2009 promete. "Bastardos Inglórios" deve estrear em 23 de outubro. E, se não for adiado pela milésima vez, "À Prova de Morte", de 2007, entrará em cartaz em 13 de novembro.

*

Sobre a suposta ordem para cortar o filme após a estreia no Festival de Cannes
Ouvi esses rumores de que o estúdio teria me mandado cortar 40 minutos. É tudo mentira. O filme está um minuto mais longo em relação a Cannes. Tinha 2h28, sem créditos finais, e agora tem 2h29. Ou 2h32, com os créditos.

Fico ofendido com a ideia de que esses caras [os produtores] ficariam mandando em mim. Ao contrário, não tenho do que reclamar. Você não tem que fazer nada sob pressão. É o seu filme, é você quem tem que viver com ele e sabe que não pode fazer julgamentos precipitados porque se arrependerá depois.

Mas você fica mais inclinado a ouvir, porque não o estão forçando a nada. Harvey Weinstein [dono do estúdio] é um cara legal. Foi ótimo trabalhar com David Linde [da Universal]. Eles têm coisas válidas a dizer. Com algumas eu concordei. Com outras, não. Sempre tentei as sugestões deles, porque eles têm muito dinheiro investido. Eles não estavam na sala [de montagem] quando tentei, e em metade das vezes eles estavam errados. Mas, algumas vezes, me peguei dizendo: “Diabos, Harvey está certo. É melhor deste jeito.”

Sobre uma eventual “prequela” de “Bastardos Inglórios”
Já escrevi metade [do roteiro]. Tenho que terminá-lo, reunir os Bastardos de novo e inserir todo um outro grupo de personagens. Durante as filmagens, Brad Pitt e Eli Roth ficavam falando: “Prequela, pequela”. Brad dizia: “Vamos convencê-lo a fazer uma prequela”. Os caras adoram a ideia. Eu tenho a história. Mas [no passado] eu ia fazer todas aquelas prequelas de “Kill Bill”, em animação. E acabei não fazendo nenhuma delas.

Sobre a pressão dos estúdios por um sucesso comercial
É, os caras estão ansiosos, e eu sei de onde isso vem. Mas um filme é um filme. Eles leram o roteiro, sabiam no que estavam se enfiando. De tempos em tempos, nós conversávamos e eu dizia: “Ouço o que vocês dizem, mas não vou fazer o filme em nada diferente do que escrevi”. Pode parecer estranho quando digo que acrescentei um minuto, mas você pode acrescentar pequenas coisas e melhorar o ritmo. E nós estávamos muito atentos a manter um bom ritmo. Para acrescentar uma cena, eu reduzi pequenos trechos de algumas cenas. Conversava com os Weinstein e a Universal, e eles diziam: “Esta sequência está um pouco longa”. Eu respondia que o máximo que podia fazer era cortar uma linha aqui, outra ali. E eles concordavam. Aí você precisa achar essa linha. É cirurgia cosmética. Harvey queria que eu acrescentasse mais música, pediu para que eu voltasse à minha coleção de discos e escolhesse mais algumas músicas. Achei quatro. E uma delas é a música-tema do filme “Os Mercenários”, de Jack Cardiff, que eu sempre quis usar.

Sobre o star system
Tem havido escolhas seletivas de evidências para argumentar seu o star system ainda é confiável ou não. Se você se refere àquele filme do jornal com o Russel Crowe [“Intrigas de Estado”], que eu não vi, talvez o star system não tenha funcionado para aquele filme. Brad teve sucesso com “Benjamin Button” e acho que ele foi uma grande razão [desse sucesso]. No passado, eu ouvia sugestões deste ou daquele ator e perguntava: “Por que você quer estas pessoas? Eles realmente levam gente ao cinema?” Olhava os filmes deles, e a resposta era não. Aprendi que a questão era menos sobre público e mais sobre marketing. Este cara é famoso, então podemos levá-lo no Leno, no Conan, no Letterman, conseguir uma capa de uma revista. Eu escolho o elenco que funciona melhor para o filme. Rosario Dawson era a garota mais famosa que usei em “À Prova de Morte”, e ela foi a todos os talk shows. Mas ela também era uma das melhores do filme. Ela é uma grande atriz, tem toneladas de carisma. Não vou contratar ninguém apenas para o pôster. E a integridade dos meus filmes fala por si.

Sobre o impacto de Brad Pitt no desempenho comercial de “Bastardos Inglórios”
Sempre confiei no meu nome na maior parte do tempo. Minha esperança agora é que eu vou atrair os meus fãs e ele vai atrair os dele. No exterior, a admiração por Brad é intensa, quase louca, mas por mim também. Espero que, conosco juntos, haja um empate. Mas posso dizer sinceramente que, se Pitt não fosse um astro e eu o tivesse encontrado na seleção de elenco, teria feito lobby para que o papel fosse dele.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Entrevista - Matheus Nachtergaele


















ENTREVISTA - Matheus Nachtergaele

Eu sou todos os personagens - diz Nachtergaele


LUIZ JOAQUIM


Na noite de terça-feira, o ator Matheus Nachtergaele veio ao Recife e esteve no Cinema da Fundação Joaquim Nabuco para um bate-papo com o público a respeito de "A Festa da Menina Morta". O longa-metragem, em cartaz naquela sala, é o fruto da primeira incursão do artista como diretor de cinema. Em entrevista coletiva, Matheus falou sobre o envolvimento, desde 1999 neste que é possivelmente seu projeto mais pessoal.

Lançado comercialmente no país há duas semanas, o filme teve sua primeira exibição a mais de um ano, na mostra Un Certain Regard, em Cannes, junto a outros 19 filmes escolhidos para aquela mostra. "Achei que com a seleção de Cannes, teríamos distribuidor garantido no Brasil, mas não foi bem assim, fomos tachados como um filme 'difícil'", recorda Matheus. De qualquer forma, Cannes foi positivo sim. A parir de lá, "A Festa..." percorreu 45 festivais de cinema (entre o Brasil e o exterior), incluído aí lugares tão distintos quanto a Transilvânia, Uruguai, Los Angeles e Cuba, entre outros.

Perguntamos se, após uma saraivada de perguntas sobre seu trabalho, tanto de jornalistas quanto do público comum (por ocasião do lançamento), Matheus percebia perspectivas diferentes de leituras entre o olho do especialista e o olho do leigo. "Até aqui, o maior volume de pessoas que viram o filme era o de gente interessada em filme autoral, que é o público de festivais, mas o público menos especializado se emociona com a paisagem brasileira e humana que está lá. Penso que uma certa parte do publico tenha se perturbado com a coragem que o filme vai para o tema que mostra. E dessa mesma forma foi com a crítica. Mas esta, olhando para um filme de estréia, procurando referências para localizá-lo. Comparam a Herzog, a Cláudio Assis, e até a Glauber, o que me chamou a atenção, apesar de também achar que há algo de barroco em 'Menina Morta' ", reflete.

Matheus parece receber tudo isso com muita tranquilidade. Sua segurança transparece em sua declaração a respeito do que resultou o filme. "Fiz o filme que queria. Na montagem, não fiz cortes por conta de receio com a temática forte. Cortamos o que realmente era gordura". Essa gordura, tinha cerca de 50 minutos além dos 110 em que resultou a versão que está nos cinemas hoje.

"Chegamos a exibir essa versão maior, com 2h40min, no festival 'Cine en Construcción' de San Sebastian, onde eles selecionam dez filmes ainda em desenvolvimento. A versão maior, que obedecia quase rigorosamente a cronologia do roteiro era generosa com o material filmado. Foi feita junto com Cao Guimarães, já a versão final com a pernambucana Karen Harlen", diz.

Sendo o ator talentoso que é, uma questão recorrente era se o diretor Matheus havia privilegiado os atores no processo de filmagem. "Costumávamos fazer um balé com a câmera de Lula Carvalho e os atores nos planos sequências, que era um desejo meu, uma vez que gosto disso como ator de cinema. Prefiro estar em cena por muito tempo. Dizer uma fala picotada por cortes é muito entediante para o ator". Há também um fator econômico aí, lembrou Matheus, pois para cada novo plano, se perdia tempo para montar a luz, e tempo é dinheiro em cinema. "Com planos mais longos, ganhávamos esse tempo".

Voltando um pouco para a pré-produção, Matheus comentou a escolha a cidade de Barcelos, na no alto Amazonas, como locação. "Inicialmente pensei em filmar em Minas Gerais, mas viajei a Amazonia e fiquei fascinado pela sua geografia física e humana, sem falar que aquele lugar é meio abandonado por todos nós, o cinema incluso. Entendi também que ali a história podia abranger além da idéia inicial que tinha para a seita "espírita-catolizante" que está na história, e que mostrar também a pajelança da Amazonia seria um jeito de abarcar o Brasil, respeitando a cultura indígena", adianta.

Sobre a participação de Hilton Lacerda, Matheus brinca dizendo que o roteirista pernambucano pegou um encrenca pela frente, pois o roteiro já existia numa versão bem definida. "Como ele é um autor, teve que encarar um projeto já com a coluna vertebral pronta, Mas ele fez uma coisa bonita, ficou com o roteiro por seis meses e ao voltar trouxe o personagem do Tadeu. Inicialmente Tadeu era um senhor, e vi que ele era um personagem do Hilton que negava a seita, percorrendo todo o filme. Mas eu não o aceitava porque todos os outros personagens tinham uma ligação sanguínea ou emotiva muito forte com Santinho, e o Tadeu não. Até que tive a idéia de fazer dele o irmão da menina morta, e aí Tadeu virou 'o' personagem, incorporando o oposto do que o Santinho representa no filme", explica.

PROJETOS

Apesar do entusiasmo com o resultado de "Menina Morta", Matheus, o ator, revela estar com saudades dos teatros. "A última vez que atuei no palco foi aqui no Recife, ha cerca de quatro anos para lançar o livro, 'Essa Febre que Não Passa'". A vida agitada entre o TV e o cinema - Matheus acaba de rodar o filme "O Bem Amado", interpretando ("com muito orgulho") Dirceu Borboleta - é a responsável por este afastamento.

O próximo projeto como diretor de cinema, em amadurecimento, foca a reserva indígena de Dourados, no Mato Grosso. "Não sou especialista no assunto, mas sou um curioso e admirador dos donos do Brasil, e também sinto uma tristeza em ver como tratamos a questão indígena no Brasil". Uma outra questão atiça a curiosidade do artista sobre aquela região, é o fato de lá residir o maior índice de suicídio per capita do mundo. O que faz esses índios cometerem tanto suicídio é algo que perturba Matheus, e que, inclusive, teve um parente próximo que tirou a própria vida.

A mais nova negociação de trabalho para Matheus como ator de cinema está em curso. Ele foi convidado para interpretar Zé do Caixão quando jovem no filme que Vitor Mafra está preparando, e que terá o próprio José Mojica Marins interpretando a si mais velho.


Fonte: http://www.cinemaescrito.com/

terça-feira, 23 de junho de 2009

Entrevista com Celso Marconi

Entrevista: Celso Marconi

Celso Marconi vai lançar DVD com 22 curtas


LUIZ JOAQUIM


Foi semana passada, em sua casa, num terraço generoso e arejado, em Bairro Novo, Olinda, que o jornalista Celso Marconi, prestes a completar 79 anos no próximo agosto, concedeu uma entrevista a Folha de Pernambuco. Quem primeiro veio receber a reportagem no portão, latindo, foi seu cachorro. "Macho ou Fêmea?", perguntamos. "Macho", respondeu Celso. "Ele é o Luc. O Jean-Luc Jomard", nos apresentou, com um sorriso.

Para quem conhece um pouco Celso Marconi, entende a brincadeira vinculando um dos maiores nomes do cinema francês, Godard, ao seu amigo de mais de meio século, o pop-filosófico Jomar Muniz de Britto. A reportagem foi atrás da novidade que Celso Marconi está organizando para anunciar em breve. O lançamento de um DVD duplo, totalizando seis horas e 40 minutos de 22 filmes, boa parte feito em Super-8, rodados a partir dos anos 1970, a década efervescente da bitola.

Seis dos filmes são apresentados finalizados e os outros em estado bruto ou retrabalhados recentemente, com inserção de uma nova banda sonora, além entrevistas no formato digital. O projeto do DVD "O Cinema de Celso Marconi" foi aprovado pelo Sistema Municipal de Incentivo a Cultura da Prefeitura do Recife em 2008 e está praticamente pronto, com as cópias do disco sendo feitas em Paris, pelo genro de Celso, que mora lá. "Ele trabalha com essa tecnologia e está tornando a confecção de mil cópias mais em conta", explica. Celso só depende agora de um apoio financeira para fazer o transporte do material para o Recife e lançar o trabalho.

Uma vez lançado, o DVD irá apresentar a uma nova geração o cineasta Celso Marconi, que alguns já conheciam como filósofo, jornalista, crítico de cinema, escritor, professor e, hoje, também blogueiro (http://celsomarconi.blog.uol.com.br) e usuário do Twitter.

Tendo iniciado a carreira como crítico de cinema já no final dos anos 1950, quando ainda não existia essa denominação para quem comentava e reportava sobre cinema nos jornais, Celso é uma rica fonte sobre a história do ofício no Recife. Uma seleção de seus escritos, ao longo da função até 1989, quando encerrou seu trabalho no Jornal do Commercio (tendo iniciado lá em 1966), já rendeu dois livros - "Obra Jornalística de Celso Marconi" (2000) e "Super 8 e Outros: Cinema Brasileiro" (2002) - e vindo mais dois a caminho.

Com tanta história para contar a Folha resolveu dividir a reportagem em duas partes. Hoje falamos da trajetória do jornalista e ferrenho crítico cinematográfico e, na edição de amanhã, do percurso que seguiu como agitador cultural, criando sessões de arte, ensinando na Universidade Católica de Pernambuco, programando cinemas e dirigindo o Museu da Imagem e do Som de Pernambuco (Mispe).


PRINCÍPIO

No princípio havia o Direito, curso superior que junto a medicia e engenharia fazia brlhar os olhos dos pais dos adolescentes nos anos 1950. Celso Marconi era um destes jovens que, após uma frustrada tentativa de passar no vestibular para Direito por orientação do pai, iniciou sua educação em filosofia na Universidade Federal de Pernambuco, quando ainda funcionava na rua Nunes Machado. Ali por volta de 1955, foi aluno na cadeira de Estética ministrada por Ariano Suassuna, personalidade com quem Celso protagonizaria um encontro polêmico vários anos depois.

Com os amigos do curso, entre eles Jomar Muniz de Britto, já frequentava os cinemas olhando para os filmes como um exercício do pensar. "Um colega, Jairo, reclamava comigo dizendo que cinema era a única coisa que a gente tinha para se divertir e eu ainda ficava olhando para o cinema como algo muito sério", relembra.

O amplo interesse o levou a frequentar alguns cineclubes, dos quais o primeiro foi o "Vigilante Cura". Era organizado pela Ação Católica, no 7º andar de um prédio na rua do Riachuelo. Depois começou a de fato estudar cinema no "Cineclube do Recife", que promovia os encontros no teatro do Quartel do Derby, coordenado por José de Souza Alencar (o colunista Alex, do Jornal do Commercio, que naquela época assinava crônicas sobre cinema com o pseudônimo de Ralph).

Foi por essa época que Celso começou a colaborar no jornal Folha do Povo, do partido comunista, também assinando sob o pseudônimo de João do Cine. Nesse mesmo período, colaborava também para o Folha da Manhã até que, Múcio Borges da Fonseca, o editor geral do Jornal Pequeno finalmente o contratou como repórter geral. Naquele tempo, os jornais não eram subdivididos em cadernos por temas como cultura, economia, esportes, etc.

"No Folha da Manhã, lembro de uma matéria polêmica que fiz sobre o serviço social que, de tanta repercussão, teve gente dizendo que a reportagem era de um outro jornalista consagrado. Fiquei lisonjeado", recorda rindo.

Não demorou muito para Celso ser convidado pelo respeitado Antônio Camelo, editor do Diário de Pernambuco. "Era tudo que qualquer jornalista podia desejar". Mas, escalado como repórter policial, o jovem jornalista quase desiste da função por o chefe de polícia cismar que ele era um comunista.

"Sumi por um tempo, mas Camelo me chamou de volta e passei a virar um caçador das celebridades que chegavam discretamente ao Recife. Eu vivia nos grande hoteis, onde todos os empregados já me conheciam, e nos transatlânticos que aportavam na cidade. Dessa forma entrevistei Malba Tahan (heterônimo de um escritor brasileiro, autor do sucesso "O Homem que Calculava") e o almirante Gago Coutinho, o primeiro a atravessar o Atlântico de avião, em 1922", regozija-se.

Pouco depois, quando Fernando Chateaubriand, filho do Assis, assumiu a superintendência do Diário de Pernambuco, renovou o jornal criando um sofisticado arquivo de redação e treinou Celso para ser o responsável ali. "De vez em quando ele chamava alguém importante para fazer um demonstração e dizia assim: peça a fotografia de qualquer pessoa para ver a velocidade do sistema. Aí eu tinha de correr".

Até que em 1963, abriu no Recife uma sucursal do respeitado carioca "Última Hora", do Samuel Weiner, onde antes funcionava o Correio do Povo. Celso foi contratado como copidesquista ao lado, do hoje novelista, Aguinaldo Silva, tendo Ronildo Maia Leite como um dos secretários. "Foi ali que comecei a escrever uma coluna diáriamente, extremamente radical, sobre cinema, assinando como Celso Marconi". Mas, o que Celso chamava de ‘radical’? Ele explica que assumia uma postura de combate contra o cinema norte-americano. "Eu não amenizava. Condenava mesmo, e era em prol do cinema brasileiro. Era um postura explicitamente nacionalista".

Só que em 31 de abril do ano seguinte, aconteceria o golpe militar e o Última Hora no Recife foi fechado. Alguns jornalistas foram presos, circunstância que se abateu sobre Celso algum tempo depois. "Fiquei preso por três meses, encarcerado numa sala pequena com 14 pessoas. Diziam que eu era terrorista, mas não fui torturado fisicamente, só psicologicamente".

Quando saiu, Celso trabalhou num instituto hoje equivalente ao INSS. "Era um salário pequeno, mas era a salvação da minha vida, até que em 1966, Vladimir Calheiros me chamou para o Jornal do Commercio. Na verdade, havia uma determinação dos militares dizendo que ex-jornalistas do Última Hora não podiam ser contratados pelo DP ou JC, mas o Calheiros desobedeu". Em 1965, antes de ir ao Commercio, Celso ressalta que o colega Fernando Spencer abria uma espaço em sua coluna no DP para ele atuar como colaborador.

1965 foi uma ano memorável. Celso viajou ao Rio de Janeiro com Spencer para cobrir o primeiro festival internacional de cinema daquela cidade, que trouxe entre outros Ingmar Bergman e Valerio Zurlini, além da presença de medalhões brasileiros como Glauber Rocha, a quem o jovem crítico foi apresentado.

Da época do Jornal do Commercio, Celso recorda já iniciar com uma coluna diária sobre cinema e de também ter atuado como copidesquista. Um momento marcante aconteceu em 1967 e 1968. "Fui editor do Caderno 4, uma publicação que saía no domingo sobre cultura. E Vladimir me dava total liberdade para eu fazer algo revolucionário no sentido formal. Eu tinha muito interesse por diagramação e inventava bastante nesse sentido. Eu brincava nos designes das capas com o ‘Pelé’, um contínuo do jornal e quem levava a fama da capa bonita era o titular da diagramação, o ‘Quarentinha’", conta sorrindo.

Claramente orgulho, Celso recorda que o Caderno 4 marcou, publicando grandes matérias sobre os jovens músicos iniciantes: "Demos duas páginas para o desconhecido Paulinho da Viola. Também passamos três dias andando pra todo lado com o Caetano Veloso na cidade, além de termos publicado no Recife o famoso manifesto tropicalista".

Algumas dessas e outras histórias do Celso jornalista podem ser lidas com as letras do próprio autor no livros mencionados acima, que aglomeram textos publicados no Jornal do Commercio entre 1966 e 1974, e no volume dois, outros escritos, sobretudo dos anos 1970. "Ainda quero lançar um terceiro volume sobre o cinema brasileiro nos anos 1980 e 1990 além de outro sobre o cinema estrangeiro". Que venham então, Celso Marconi


Além da crítica


Se a carreira do jornalista Celso Marconi impressiona não só pela qualidade mas também pela longevidade em seus mais de 40 anos de atividade, encerrada em 1989 no Jornal do Commercio, como detalhamos na edição de ontem, é também de impressionar a atuação de Celso como cineasta - que lança em breve um DVD duplo com 22 registros em audiovisual - como professor de jornalismo, como diretor do Museu da Imagem e do Som de Pernambuco (Mispe) e como programador de cinema.

Nesta última função, começou na segunda metade dos anos 1960 a partir da iniciativa de Fernando Spencer, que criou uma sessão de arte na Soledade, com a ajuda do pároco do lugar, o monsenhor Salles. "Depois fomos para o Cine São Luiz, às 10h do sábado, e era um sucesso, sempre lotando a sala. Uma pessoa que nos ajudava dando muitas dicas de filmes era o crítico Ivan Soares. E o gerente do Grupo Severiano Ribeiro, o José Ronaldo Gomes, foi uma figura extraordinária que possibilitou tudo isso. Lembro que quando o Grupo lhe demitiu, escrevi um artigo massacrando o Severiano Ribeiro", recorda Celso.

Depois do São Luiz, as famosas sessões de arte migraram para o Cine Trianon e finalmente foi para o Coliseu, a maior sala da cidade, onde passavam muito filmes de Pasolini, Godard, Bergman, Fellini e outros clássicos europeus. "Houve uma época de tanto sucesso que chegamos a produzir um show com Chico Buarque dentro do Coliseu", aponta como um momento marcante.

Por essa época, Celso era, junto ao Grupo 8 e a Fundação Joaquim Nabuco, um dos responsáveis pelo Festival de Super 8 do Recife. Ele recorda da presença do mítico crítico Paulo Emílio Salles Gomes na cidade reclamando que os jornais locais davam duas páginas para Pasolini, com um filme em cartaz, quando o que deveria receber destaque era o festival nacional. A experiência de programador levou Celso a ser convidado a administrar o Cinema do Parque. "Foi uma fase áurea, com até 1200 pessoas por sessão".

Em 1980, Celso começou a atuar também como professor no curso de comunicação social da Universidade Católica de Pernambuco, onde ficou até 1994. Três anos antes, havia assumido a diretoria do Mispe onde criou a sala de vídeo Fernando Spencer e voltou a promover memoráveis sessões de arte, agora no Cine Ribeira, Centro de Convenções. "Passei por três governos no Mispe, até sair em 2003".

Na mesma época o jornalista editou o Suplemento Cultural do CEPE, quando resgatou seu ímpeto de designer revolucionário dos tempos do Caderno 4, no Jornal do Commercio lá pelos idos dos anos 1960. "Certa vez pus uma mulher nua na capa e depois de 14 mil exemplares rodados, fui obrigado a cancelar tudo apesar de não haver nada de apelativo na imagem".

Hoje, aposentado, Celso alimenta de vez em quando o seu blog (http://celsomarconi.blog.uol.com.br) com textos tão vigorosos quanto o de outros tempos. Muito embora, o que vem curtindo atualmente é a experiência no Twitter, no qual a filha cadastrou o moderno pai recentemente.


Fonte: http://www.cinemaescrito.com/